quarta-feira, 23 de agosto de 2017

Hellblade Senua´s Sacrifice Crítica.


Uma viagem às profundezas do inferno...da mente.

Por Marlon Fonseca



No cenário atual do mercado de games há uma divisão bem clara na abordagem e tratamento aos jogos. De um lado os jogos e franquias blockbusters, tipo AAA, de grande orçamento, campanha de marketing gritante e a preferência pelo espetáculo e grandiloquência. Já do outro existem os indies, com produção mas contida mas que apostam na narrativa, no sensorial ou na simplicidade. Poucos conseguem ficar na linha tênue entre esses estilos de produção. Graças ao esforço da Ninja Theory Hellbalde consegue transitar entre ambos trazendo o que de melhor cada experiência pode proporcionar.

Para isso, o estúdio, conhecido por produções como Heanvely Sowrd, Ensalved, DMC, cujas características comuns são a captura de movimentos e expressões faciais elaboradas e bom sistemas de combate, mas com uma história por trás, optou por fazer do seu novo jogo uma produção simples, com equipe reduzida e distribuição um pouco mais barata O resultado é uma pérola que se escora em sua caprichada narrativa mas com um visual estonteante.

Na história, Senua desce ao inferno da mitológia nórdica em busca da alma de seu amado. Mas lá enfrenta perigos piores do que imaginava: os seus demônios interiores. O jogo na verdade é um tratado sobre psicopatia e trata do assunto com propriedade, habilidade e cuidado. O mais interessante é que o assunto é incluído de forma sutil eu sua história.[1] Os diálogos são brilhantes e os lendo sabendo-se do duplo sentido da história se tornam ainda mais geniais.

Assim, a maior das forças de Hellblade sem dúvidas é sua narrativa e principalmente da forma que ela é desenvolvida e integrada em todos os elementos do jogo

O uso do som, com forte influência na linguagem cinematográfica é um dos seus maiores pilares. Senua ouve vozes. O tempo todo. E são elas não somente o fio condutor da história como seus guias e até mesmo servem para atrapalhar seu caminho. Os efeitos visuais também ajudam na construção de clima e de perturbação no jogador.
Nossa maior batalha acontece em nossa mente


Os jogos em VR já usam o som em 3D como elementos de imersão mas Hellblade é o primeiro jogo padrão, fora dessa tecnologia, que utiliza-se de fato desse expediente (não é a à toa que assim que se começa o jogo há o aviso de que ele será melhor apreciado em um headset).

As informações passadas são o mínimo necessário para se descobrir o que se fazer a seguir além de confundir e perturbar a mente da protagonista e em alguns casos até mesmo do jogador.

Aliado a isso, o level design do jogo também demonstra de forma bastante sutil o que fazer e para onde seguir.

Os gráficos e a direção artística compõem o clima porposto pela narrativa


Até os atributos do dualshock servem como elemento de imersão na história. As luzes variam de cor conforme os momentos da trama.  Em um determinado desafio a vibração do controle será seu único guia.

Na empreitada a personagem irá se deparar com problemas que devem ser resolvidos para que possa prosseguir.  Esses puzzles brincam também com a percepção com expedientes como jogos de espelhos, alinhamento de imagens, uso do foco. Todos são interessantes e também estão e acordo com a subtrama da psicopatia que o jogo aborda.

A única questão é que alguns deles depois de um tempo tornam-se repetitivos. Isso acaba por prejudicar um pouco o ritmo e o desenvolvimento da narrativa.
O jogo oferece momentos macabros e angustiantes.


Mas Senua também encontra inimigos que geram batalhas sangrentas. O sistema de combate é mais simples do que a empresa costuma oferecer mas eficiente à proposta do jogo. Em momentos mais agudos, porém, a câmera pode atrapalhar um pouquinho.

As batalhas contra os chefes são brutais e diversificadas o suficiente para sempre manter o interesse e o impacto. O visual, histórico e habilidades dos vilões auxiliam a manter o interesse. Já os inimigos comuns possuem pouca variação e ainda que cada um exige um determinado padrão eles são fáceis de se entender.

Ainda dentro dos aspectos do jogo existem marcos com runas espalhados nos cenários que, se focados, podem dar pistas sobre a história e trazer informações interessantes sobre a mitologia nórdica.
Percepção, foco e a sanidade do jogador são testados a todo momento.


Os gráficos seguem o padrão dos jogos AAA dessa geração. Não é exagero afirmar que se trata de um dos visuais mais bonitos apresentados até agora.

A direção de arte destaca isso. Cenários detalhados, paisagens belíssimas e variações de cores e elementos que ajudam a destacar morbidez geral do jogo e seu clima sombrio intercalado de raros momentos de beleza natural. A modelagem e expressões de Senua a tronam extremamente vívida (a atuação de Melina Juergen também ajuda muito nesse quesito).

E acreditem nisso: o jogador encontrará momentos macabros, perturbadores, angustiante, sufocantes e questionamentos filosóficos sobre a vida, a morte e a sanidade o tempo todo em sua jornada.

Por fim, cumpre destacar a brincadeirinha que a empresa fez com os jogadores com o claro intuito de mexer, ainda mais, com os seus psicológicos: logo no começo do game há um aviso que caso se morra muito o save seria apagado o que obrigaria a recomeçar tudo.[2]
Imediatamente a comunidade gamer reagiu a essa mecânica e em questão de dias descobriu-se que trava-se de um blefe.
Uma angustiante viagem ao inferno mental


Nada contra a essa eventual situação se empregada de fato. Mas transforma-la apenas em um boato bobo acabou se tronando um expediente desnecessário por parte a empresa que no fundo nada de positivo acrescentou ao jogo.

Hellblade é uma trabalho primoroso da Ninja Theory. Uma obra que soube mesclar o deslumbramento de jogos de grande apelo à narrativa aprofundada, bem trabalhada e intimista dos indies.

obs: após terminar o jogo não deixe de assistir ao documentário sobre seu desenvolvimento que está disponível na tela de menu, em sua última opção.

Prós:
-Narrativa inteligente e jogabilidade integrada dentro de sua proposta
-Impecável trabalho sobre distúrbios mentais
-Brilhante uso da linguagem sonora
-Gráficos e direção de arte estonteantes
-Informações interessantes sobre a mitologia nórdica.

Contra:
-Puzzles repetitivos em alguns momentos
-Divulgação desnecessária de uma mecânica inexistente.

Nota : 9,5

Ficha Técnica:
Hellblade: Senua´s Sacrifice
Gênero: Ação, Adventure.
Produtora(s) SEGA.
Data de Lançamento: 8 de Agosto de 2017 para PS4 ePC






[1] Outro jogo que tratou recentemente do tema é o survival horror The Park disponível me plataformas digitais para os consoles dessas geração.
[2] Relembrando de imediato a Eternal Darkness para Game Cube que também continha uma mensagem assim para assustar os jogadores.