quarta-feira, 15 de março de 2017

Dissecando #1 - Batman: O Cavaleiro das Trevas



Dissecando #1 – Batman: O Cavaleiro das Trevas

Por Marlon Fonseca


Passados nove anos da estreia de Batman – O Cavaleiro das Trevas nos cinemas, fica hoje mais fácil de avaliar friamente a obra que figura com extrema justiça em várias listas de filmes mais importantes dos últimos tempos.

Ainda na divulgação de seu longa, o diretor Christopher Nolan esclareceu a sua inspiração em Fogo Contra Fogo. Quem conhece a obra de Michael Mann consegue de fato vislumbrar ecos estruturais em ambos. Temos, assim uma historia de dois homens que transitam e defendem lados opostos, e á medida que vamos conhecendo seus dilemas melhor e o inevitável confronto entre eles está para acontecer, todos ao seu redor são gravemente afetados.

Primeiramente na figura do Batman que, pela primeira vez em sua jornada, começa a acreditar que está colocando Gotham City em ordem. Christian Bale volta ainda melhor ao papel sabendo definitivamente esmiuçar as nuances e complexidades estabelecidas ao protagonista.

E justamente nesse momento, surge um agente do caos e da anarquia, vestido de palhaço, uma força da natureza que “só quer ver o circo pegar fogo” (define Alfred do excelente Michael Caine em um dos muitos fantásticos diálogos que o roteiro apresenta). A atuação de Heath Ledger está entre uma das maiores que o cinema já presenciou. Uma composição minuciosa, complexa que enfoca todos os elementos possíveis como o gestual (o personagem possuir uma postura sempre torta para externar o seu desequilíbrio mental), no passar de língua em sua cicatrizes, na voz e na risada que faz gelar qualquer coração.

A ordem e o caos: duas faces de uma mesma moeda


Os dois são ao mesmo tempo representantes de ordem e caos respectivamente, dois lados de uma mesma moeda que ao mesmo tempo se antagonizam e se completam. Há uma relação simbiótica onde um precisa do outro necessariamente para existir.

O roteiro demonstra isso o tempo todo implicitamente e em dois momentos de forma explicita: o interrogatório na delegacia e no dialogo final entre ambos no ultimo ato (aqui temos vislumbre da brilhante HQ piada mortal).

Por falar em dois lados e moedas, no meio desse embate temos a figura de Harvey Dent (Aron Eckhardt em uma atuação segura) que nada mais é que uma peça nessa disputa entre Batman e Coringa. Para o primeiro, ele representa a esperança de uma cidade melhor, o “cavaleiro branco que Gotham precisa”, um tipo de justiça legalizada, diferente do apresentado pelo vigilante mascarado. Já para o segundo, ele é a possibilidade de mostrar seu ponto de vista que todos se corrompem em algum momento de pressão (outra essência clara de A piada Mortal).

Fonte de inspiração: A piada mortal é o relacionamento simbiótico entre Batman e Coringa

O resultado não poderia ser outro e Dent transforma-se em Duas Caras, a personificação desses pontos de vista antagônicos trabalhados no filme e a representação do conflito entre o bem e o mal que todos vivem diariamente.

No fogo cruzado, Duas-Caras é a personificação do conflito entre o bem e o mal


Além dele, Rachel Dawyes (Maggie Gallenhal que rouba para si o papel que antes foi de Katie Holmes e o aprofundou ainda mais) e o Comissário Gordon (mais um trabalho excepcional de Gary Oldman) também são afetados no meio desse embate
.
Soma-se a isso e temos um verdadeiro tratado sobre policiamento, aqui em sua definição ampla. Seja na discussão sobre a melhor forma de se buscar e realizar justiça, vivida pelo quarteto Batman-Gordon-Dent-Rachel como também na questão, ainda delicada pós-11 de Setembro, sobre a vigilância e seus limites na subtrama encabeçada por Lucius Fux (Morgan Freeman).

Abordagem complexa sobre a questão de justiça e policiamento

Com essas e outras peças na mesa, o filme se desenvolve dentro de uma estrutura de thriller policial, que aos poucos vai apresentando e montado o jogo com um roteiro extremamente inteligente e com a montagem que o acompanha e mantem o ritmo do filme.

Para embalar toda história, a trilha sonora orquestrada de Hans Zimmer a transforma em uma verdadeira ópera trágica.

A direção de Nolan mantém ao máximo possível a historia no plano da realidade e a opção em usar efeitos praticas mesmo em sequencias dificílimas como o capotar de um caminhão e a explosão de um hospital (que resultou numa improvisação sensacional de Ledger) qualificam ainda mais a obra.

O homem por trás das câmeras: Nolan soube trazer temas e subtemas complexas sob a ótica de personagens icônicos


Assim, temos em Batman – O Cavaleiro das trevas um filme bem dirigido, roteirizado, montado, interpretado que travestido de trama policial esmiúça a natureza humana através da utilização de personagens icônicos da cultura pop mundial.