Os subtextos sociopolíticas em filme de zumbi tendo como exemplo O Despertar dos Mortos
Por Marlon Fonseca
Dentro do gênero terror, o de “filme
de zumbis” permanece entre os mais populares. Tratando de questões como a volta
de pessoas mortas e trazendo sempre imagens fortes e grotescas ele também traz
em seu bojo, ainda que de forma indireta, várias questões e críticas sociais.
Vimos anteriormente que o roteiro é
a pedra fundamental de um f ilme. É nele
que se inicia o processo de produção e contém de forma escrita toda a história
do filme além de informações de personagens, ângulos de câmera, cenário, etc. É
nele, também que há as indicações de eventuais subtramas ou subtexto, é o
“falar nas entrelinhas”.
“Se você é um verdadeiro fã do
horror, acaba desenvolvendo a mesma sofisticação que um apreciador de balé
desenvolve – cria uma sensibilidade para a profundidade a e textura desse
gênero”, destaca Stephen King[1]
A afirmação acima é importante para
ilustrar dois pontos: o primeiro corrobora o que foi falado anteriormente. O
“leitor” de um filme, quanto mais ciente da complexidade e amplitude de sua
linguagem, mais aberto ficará para absorver as informações contidas nele. Já
num segundo plano, impõe, ainda que indiretamente o conceito de subtexto.
Subtexto pode ser definido como “mensagem
implícita ou subentendida naquilo que alguém diz ou escreve”[2] E os filmes de zumbis utilizam-se bastante
desse expediente para trazer críticas políticas e sociais.
Os
filmes de zumbis modernos trazem verdadeira alegoria política. Desde a década
de 1960, estas criaturas assustadoras são usadas no cinema como uma poderosa
metáfora crítica originária do mundo anglo-americano para apontar, por um lado,
os excessos das sociedades capitalistas e da sociedade de consumo e, por outro,
chamar a atenção para as lutas por direitos civis.
George
Romero com seu A noite dos mortos vivos
de 1968, não criou o gênero, mas estabeleceu vários parâmetros que são
utilizados até hoje. Para Bem Harvey, um estudioso da obra de Romero o filme
estava conectado com “às realidades contemporâneas e às questões que estavam na
ordem do dia em fins da década de 1960: o racismo, o colapso da família nuclear
americana e a ressurreição do conservadorismo político”[3].
Mas foi, em sua sequência “Despertar dos Mortos”, de 1978 que essas aspectos
foram ampliados e tornaram-se mais visíveis e contundentes.Na
trama, passada após os eventos do filme anterior, o apocalipse zumbi ali
iniciado começa a se espalhar por todo o país. Um grupo de sobreviventes se
refugia em um shopping center na tentativa de se defender dos perigos.
O
“palco” inicial de Despertar dos Mortos
já traz uma forte crítica social. O filme é passado quase que totalmente dentro
de um shopping center, que desde
aquela época, e até o presente momento é usado como um dos principais símbolos
do consumismo desenfreado.
Ver pessoas com olhar distante, voz
murmurante, passos arrastado ou em correria sem sentido é uma metáfora quase
explícita do que presenciamos em um shopping center qualquer.
Outra questão interessante é ver um
dado zumbi repetindo as atividades que fazia quando “vivo”, como por exemplo,
um guarda de trânsito sinalizado a ermo. Essa é uma crítica velada ao
condicionamento excessivo, algo que Charles Chaplin já havia eternizado em Tempos Modernos, em 1936.
Em
uma sequência do filme essas duas afirmativas são claramente expostas. Centenas
de zumbis cercam o lugar – que frequentavam antes de morrer – tentando entrar
para satisfazer sua fome. Ao finalmente adentrar o local, os mortos-vivos andam
de um lado para outro por corredores, galerias e escadarias, e empurram
carrinhos carregados de produtos que não vão usar.
Outra questão sempre pertinente ao
gênero é a quebra da ordem social. Com o surgimento da infestação de zumbis,
não há mais governo, exército, polícia. Há a sensação de desespero e a busca
pela sobrevivência que trazem á tona o que há de pior na humanidade. Nesse
cenário, as pessoas acabam mostrando o seu pior, com atos de individualismo e
crueldade na busca pela sobrevivência, deixando a questão de quem na verdade é
o “selvagem” na história.
Segundo o próprio Romero
“Meus zumbis são
puramente um desastre. Eles são um desastre natural. Deus mudou as regras e de
alguma maneira, essa coisa toda está acontecendo. Minhas histórias são sobre
humanos que lidam com isso de maneira estúpida, e é por isso que eu os uso. Eu
os uso meio que para fazer gozação com o que está acontecendo com um
número de eventos sociais. E é isso, eu não os uso somente para criar
carnificina. Mesmo que eu use carnificina, não é sobre isso que meus filmes
são, eles são muito mais políticos.”[4]
Assim, além de sustos e cenas
marcantes os filmes de zumbis contêm mensagens sociais e políticas, sendo
reflexos da sociedade na qual estão inseridas.
Acabamos de ver algumas nuances a
respeito da linguagem escrita no cinema. O roteiro contém todas as informações
necessárias para as filmagens além de incluir subtextos para ampliar a sua
mensagem.
[1] KING, Stephen,
Dança Macabra, Rio de Janeiro: Objetiva., 2003, página 99
[2] subtexto in
Dicionário infopédia da Língua Portuguesa com Acordo Ortográfico [em linha].
Porto: Porto Editora, 2003-2016. [consult. 2016-11-08 14:09:20]. Disponível na
Internet: https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa/subtexto
[3]
http://cadaumnasualua.blogspot.com.br/2013/08/george-romero-e-secularizacao-dos-zumbis.html
[4] http://umzumbipordia.blogspot.com.br/2012/01/george-romero-explica-os-zumbis-de.html